16.5.13

O efeito Angelina


Há alguns anos, minha médica sugeriu que eu fizesse o teste genético para a mutação do BRCA 1 e 2. Minha mãe morreu aos 29 anos de um câncer de mama violentíssimo, descoberto logo após meu nascimento. Eu não tinha dois anos quando ela se foi. Eu já fazia (como ainda faço) exames anuais, não uso anticoncepcionais hormonais, não fumo, tento manter meu peso, mantenho um estilo de vida relativamente saudável.

Engoli em seco e disse que ia pensar.

Na consulta seguinte, ela continuou com o assunto, enfileirando motivos como grupo étnico, o fato do câncer da minha mãe ter surgido quando ela era tão jovem (eu, na época, devia estar perto dos 30), e yadda-yadda-yadda. Minha pergunta foi: “Doutora, o que muda na minha vida se der positivo para a mutação?” Ela deu de ombros: minhas opções seriam continuar o monitoramento e uma mastectomia preventiva, talvez ter que tirar os ovários também.

Declinei. O que preciso fazer, eu já faço. Saber que eu não tenho a mutação talvez me fizesse relaxar na minha rotina médica. Saber que a tenho me deixaria para sempre questionando minhas escolha de não fazer a mastectomia, ou então a ansiedade ia me fazer concordar com uma mutilação que, sinceramente, me traz arrepios só de imaginar. E ainda me faria desistir de parte dos meus sonhos para garantir uma sobrevivência que, convenhamos, não é certa, porque não há como saber com 100% de certeza que o câncer da minha mãe veio do BRCA. Minha avó materna, por exemplo, está com 84 anos e nunca teve nada. A doutora entendeu meus motivos e nunca mais tocou no assunto.

Mas eu entendo a escolha da Angelina Jolie. Fiquei bastante impressionada com sua decisão de tornar público todo esse processo, achei admirável. Por cinco minutos, eu questionei a minha decisão. Mas passou, porque eu sei que sou bem mais feliz sem saber.

Se eu tivesse filhos pequenos como ela, as coisas seriam diferentes. Eu teria a quem proteger de todo o sofrimento que o câncer causa -- conheço bem demais o buraco que a morte da minha mãe fez na vida de todos da minha família. É por causa dos que eu amo que estou lá, todo ano batendo ponto no laboratório, tirando sangue, fazendo mamografia e milhares de ultrassons. É o que consigo fazer no momento. Claro que todo esse forrobodó da Jolie teve seus efeitos na minha vida. Fora as mensagens dos amigos de "nossa, lembrei tanto de você quando li esse lance da Angelina", minha avó de repente se lembrou: "Nati, você já marcou o médico?", se referindo à minha consulta anual à ginecologista. Na hora rebati: "Isso é por causa da atriz, Baba?". Admitiu que sim e engatou, meio gaguejando, que queria que eu fizesse o BRCA. Mas ela, que enterrou sua filha e durante anos não conseguia nem manter fotos dela pela casa, compreendeu minhas razões. Ela ainda vai insistir um pouco, que eu sei. Mas no fim, vamos nos entender.
Pode ser que eu mude de ideia, que a minha vida mude e me faça valorizar mais certezas do que possibilidades. Por enquanto, escolho não saber se carrego ou não uma bomba-relógio no peito. PS: Para quem está debatendo se faz ou não, sugiro a leitura deste texto aqui da Salon: Angelina Jolie, meet Nate Silver. A autora discute a tendência de ler estatísticas de maneira emocional, e os impactos que isso tem nas nossas escolhas médicas.

2 comentários:

Anônimo disse...

oi nat, não sabia de tudo isso! como sempre, bem escrito e emotivo sem ser piegas. bjs nogall

Unknown disse...

Decidido!!! Ricardo.